Por Paulo Miranda
Assumi o desafio de substituir o colega
jornalista Chico Sant’Anna por três semanas. Pensei muito sobre o que escrever
nesta primeira coluna. E resolvi contar que sou vegetariano desde a barriga da
minha mãe.
Outro espécime raro, igual a mim, é o advogado
Ulisses Riedel, presidente da TV Supren (canal 2 na NET) e proprietário dos
restaurantes veganos Supren Verda e Villa Vegana. Meus filhos são carnívoros,
mas Ulisses é pai de sete filhos, todos vegetarianos, e tem 20 netos também
vegetarianos.
Já me senti pária social inúmeras vezes por
causa da minha origem vegetariana. Às vezes ainda me sinto assim em certos
eventos, restaurantes e festinhas. Tudo tem carne.
Mas a vida para o vegetariano melhorou muito. E
vai além da busca por alimento saudável e sem veneno. Há uma procura frenética
por alimentação vegetariana, alimentos orgânicos, sem agrotóxicos, que muito me
alegra e me iguala socialmente.
GDF apoia feirinhas de orgânicos
As feirinhas de orgânicos estão por toda parte.
Quem quiser fugir dos agrotóxicos pode acessar a lista de feiras orgânicas
existentes no DF e no país no mapa das feiras orgânicas, no endereço https://bit.ly/2Hf9Pq6.
Até o governo do DF percebeu a importância da
alimentação saudável e resolveu abrir os parques de lazer para os produtores
venderem seus orgânicos. Os produtores, associações e cooperativas foram
selecionados no ano passado para os Parques da Cidade (Asa Sul), Olhos D´Água
(Asa Norte), Sudoeste, Dom Bosco (lago Sul), Ezchias Heringer (Guará),
Jequitibás (Sobradinho), Sucupira (Planaltina), Três Meninas (Samambaia) e
Vivencial do Lago Norte.
Nas entrequadras e no Eixão do Lazer é possível
encontrar outras feirinhas com produtos orgânicos, salgadinhos vegetarianos e
veganos, bem como doces veganos. Há até food
trucks na onda da alimentação saudável, facilitando a vida de quem quer
fugir dos venenos e de alimentos de origem animal.
Fazenda Malunga, a maior do País
Porém, a produção em maior escala em Brasília
fica por conta da Fazenda Malunga. Comparo a fazenda de Joe Valle e esposa à
Aldeia Gaulesa, invencível diante do império romano, 50 anos antes de Cristo. A
Malunga resiste ao império do agrotóxico, assim como Obelix e Asterix
enfrentaram e derrotaram os romanos.
A Malunga hoje tem uma rede de cinco
supermercados orgânicos (dois em Águas Claras, um pioneiro na Asa norte, um no
Sudoeste e outro na Asa Sul), é a maior fazenda produtora de hortaliças
orgânicas da América do Sul e sempre oferece cursos e oficinas sobre a produção
orgânica para movimentos sociais, artistas e pessoas interessadas em plantar e
colher alimentos saudáveis.
Neste espaço tenho o dever de prestar
reverência às mulheres deste país que sabem o que é semente crioula, fonte de
saber para o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a Via
Campesina Internacional.
A semente crioula é uma cultura milenar e
internacional. Em 2007, no 7º Fórum Social Mundial de Nairobi, a mercadoria
mais importante na bagagem dos zapatistas eram espigas de milho negro e
vermelho, que entregaram de presente ao povo africano em meio a uma mística de
resistência cultural e celebração.
Igreja Adventista é o berço do vegetarianismo
Porém, há de se fazer justiça. O berço
brasileiro do vegetarianismo vem dos princípios filosóficos da Igreja
Adventista Reformista do Sétimo Dia e da Igreja Adventista do Sétimo Dia. A
primeira igreja mantém três restaurantes – dois na Asa Norte e um em
Taguatinga. Por exemplo, o Boa Saúde, no Rádio Center, tem mais de 30 anos. A
Igreja Adventista Reformista do 7º Dia é a mais radical com seus fiéis. Ao
entrar para a igreja, o fiel precisa se converter ao vegetarianismo.
O braço mais antigo que conheço da comida
vegetariana veio da Índia, com o Movimento Hare Krishna. Sempre fiz questão de
ficar amigo de todos eles, interessado, é claro, nas refeições que serviam após
os cânticos repetitivos. Os pratos eram deliciosos.
Porém, este braço que ora só cresce em Brasília
corre sério risco após o golpe midiático-jurídico contra a presidenta Dilma e
com a prisão de Lula. A indústria do veneno participou do golpe. Para se ter
uma ideia da velocidade com que a questão avança, mais de 50 marcas receberam
licença para comercialização de novos agrotóxicos no Brasil apenas em 2018. Há
quase dois mil novos registros de agrotóxicos, entre químicos e orgânicos, na
lista do Ministério da Agricultura.
Bolsonaro incrementa uso de veneno
Além disso, após a posse do presidente Jair
Bolsonaro mais de 290 agrotóxicos foram liberados no país, muitos banidos nos
países da Europa. Por isso, a ministra da Agricultura, deputada federal
licenciada Tereza Cristina (DEM-MS) é mais conhecida como a “musa do veneno” ou
mesmo “menina veneno”.
O Congresso Nacional não colabora. Afinal, a
ministra presidiu a Frente Parlamentar Agropecuária, conhecida popularmente
como a “bancada ruralista”. Com 200 ruralistas vinculadas ao agronegócio,
aprovou dois projetos de lei prejudiciais ao povo brasileiro: o PL 6299/2002,
que facilita a comercialização e o uso indiscriminado de agrotóxicos no Brasil,
e o PL 4576/2016, que proíbe a venda de produtos orgânicos em supermercados.
Para finalizar, deixo uma dica sobre a
seriedade do tema. Assista ao documentário do cineasta Silvio Tendler,
ex-secretário de Cultura do DF no governo Cristovam: É o Veneno na Mesa (https://bit.ly/2QWwgnA).