Cristovam Buarque e Alfredo Pena-Vega (*)
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Os stalinistas chamavam de reacionários, anticomunistas ou agentes da CIA aos democratas liberais que denunciavam os crimes de Stalin. Fui lembrado disso ao tratar sobre Gaza nos dias de hoje. Qualquer um de nós que respeita o povo judeu, reconhece o direito de existência do Estado de Israel, admira o que este país fez na inóspita terra que recebeu e conhece seu exemplo na educação fica com receio de ser acusado de antissionista e se intimida em criticar o que fazem hoje as tropas israelenses contra o povo de Gaza. Mas, como antes, não é hora de silêncio.
Desde o século XIX, o sonho de líderes idealistas como Theodor Herzl pela criação de um estado para reunir em um território o historicamente perseguido povo judeu foi uma das maiores aventuras do espírito humano. Independente de discordância sobre a correção do local escolhido, a criação de Israel pelas Nações Unidas foi um dos fatos mais notáveis do século XX. Isto justifica o reconhecimento da existência de Israel e seu direito à autodefesa. Mas é injustificável se calar diante do que sofre o povo de Gaza.
Israel tem o direito de se defender contra foguetes lançados sobre sua população civil, um ato que pode ser considerado terrorista. Estes lançamentos devem ser impedidos tanto pelo uso de tecnologias como também atacando os autores. Mas no lugar de as FFAA de Israel enfrentarem terroristas estão massacrando o povo que mora em Gaza. Não são alguns terroristas que foram presos, foram mais de 1.200 civis mortos, entre os quais mais de 250 crianças. A destruição não atinge apenas as bases de lançamento de foguetes. Foram mais de 4 mil casas demolidas por bombas, além de hospitais e escolas. Gaza inteira foi jogada na escuridão da falta de eletricidade, com todas as suas consequências.
A vitória de Israel, mesmo exterminando Gaza para acabar com todos os pontos de lançamento de foguetes, virá ao custo de uma derrota moral na opinião pública mundial e não trará paz duradoura para a nação israelita. Alguns palestinos sobreviverão e o ódio será ampliado. A sobrevivência de Israel, ao longo dos próximos séculos, vai exigir uma força moral que o massacre de Gaza está comprometendo. É como se o Hamas e Israel se unissem para destruir Gaza, empatando na derrota moral de ambos.
É comum aos que estão no poder, enfrentando atos como foguetes de destino indiscriminado, perderem o sentido crítico da moralidade de seus atos e suas consequências, e é comum que os aliados, por medo, por autocensura, por acomodamento ou por simples obtusidade deixem de fazer as críticas necessárias. Fiquem também apequenados moralmente e deixem de ser aliados críticos para se transformarem em apoiadores irresponsáveis.
Com todos os riscos e incompreensões que isso possa provocar, é preciso dizer que a escuridão em Gaza não ilumina o futuro de Israel.
(*) Professor da UnB e senador (PDT-DF); e professor do Centro Edgar Morin da França.