Após dois dias de greve, um acordo foi firmado entre rodoviários, da Pioneira, Marechal e São José, e empresários. Já na manhã desta sexta-feira (18), os ônibus voltaram a circular. A promessa é de que os funcionários receberão o reajuste salarial ainda hoje.
Nessa quinta-feira (18), segundo dia de paralisação, os passageiros amanheceram mais preparados, mas tiveram que dar seu jeitinho para ir ao trabalho, escola ou outro compromisso. Com 100% da frota destas empresas nas garagens, os cerca de 320 mil brasilienses afetados tiveram de optar por veículos clandestinos, carros de passeio, metrô ou, ainda, dormir na casa dos patrões.
Além disso, o Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região negou liminar ajuizada pelas empresas contra o sindicato, pedindo o retorno imediato dos rodoviários ao trabalho. Segundo o desembargador André Damasceno, a falta de pagamento justifica a paralisação.
Compromisso
A babá Gilvanete Freitas, 23 anos, não podia deixar de trabalhar. Moradora do Gama, teve de dormir na casa dos patrões em virtude da greve que afetou o Expresso DF. “Da mesma forma que eu, os patrões precisam trabalhar e não podem deixar as crianças com outra pessoa. Eles dependem de mim”, conta.
Mas nem todos tiveram essa oportunidade. A também babá Gilda Souza, 29, pagou R$ 12 por um percurso que normalmente custa R$ 3. De São Sebastião, pegou um veículo clandestino até o Lago Sul. “Um dos piratas era, inclusive, uma van escolar”, lembra.
Clandestinidade livre
Ônibus, vans e carros clandestinos foram a escolha de muitos brasilienses. Em uma parada na divisa do Recanto das Emas com o Riacho Fundo, 30 pessoas aguardavam. Em cinco minutos, oito veículos sem autorização “ofereceram carona”. Embora alguns mantivessem as tarifas dos ônibus, outros superfaturavam os valores. Para um percurso de aproximadamente dez quilômetros, cobravam R$ 4 – mais que o dobro da tarifa. Os valores, entretanto, chegavam a R$ 15.
Sem saber quando chegaria ao trabalho, no Gama, a telefonista Maria Lúcia Simões, 48, aguardava um ônibus pirata. “Não tenho coragem de pegar os carros que cobram pelo percurso porque acho perigoso, mas se vier um ônibus ou uma van que tiver mais pessoas, vou”, assume. O que não podia era deixar de chegar ao serviço.
Passageiros preferem encarar riscos
De São Sebastião até Águas Claras, Tatiane de Sousa, 29 anos, também teve de optar por veículos clandestinos antes mesmo das 6h. A atendente conta que após 50 minutos de espera, conseguiu entrar em uma van “menos lotada”. “Moro próximo ao terminal da cidade e, ainda assim, demorou muito até passar um veículo que desse para entrar”, conta.
Sobre os perigos de utilizar serviços não autorizados, ela confessa: “morro de medo, mas era minha única opção. Deixar de trabalhar é que não poderia”.
Insegurança
Com destino à Taguatinga, a copeira Cleide Lima, 46, aguardava que alguém do trabalho fosse buscá-la. “Fiquei duas horas esperando e nada de transporte. Eles vêm me buscar, mas não sei como voltarei para casa. É um sofrimento”.
Aguardando há mais de três horas, o assistente de faturamento de um hospital em Taguatinga Lucas Santos, 21 anos, pensava em voltar para casa. Piratas não seriam uma opção. “As empresas nos pagam o dinheiro contado, não acho justo termos que pagar a mais por falta de ônibus”, confessa. Apesar disso, ele entende a paralisação: “os rodoviários estão cobrando o direito deles”.
Mais carros nas ruas
O governo não tomou nenhuma medida prática para amenizar o transtorno. Segundo o DFTrans, o remanejamento de frotas de ônibus não é possível, uma vez que cada empresa é responsável por uma bacia. Assim, sem possibilidade de chegar aos destinos de ônibus ou com dificuldades para chegar ao metrô, os usuários do transporte público brasiliense tiraram os carros das garagens.
É o caso do garçom Denis Dirões, 24 anos, e da estudante Carolina Oliveira, 27. O primeiro esperou em vão por uma hora na parada de ônibus, em Brazlândia, até que desistiu. “Voltei para casa e peguei o carro para não perder o dia de trabalho”, explica.
Carolina, por outro lado, já saiu de casa com veículo próprio. Moradora do Novo Gama (GO), utiliza o Expresso DF para chegar ao Plano Piloto. Após a paralisação que resultou em confusão na quarta, como mostrou o JBr. ontem, ela resolveu sair de carro para não correr riscos.
As faixas exclusivas para ônibus da EPNB e da EPTG foram liberadas para todos os veículos pelo Departamento de Estradas de Rodagem até o fim das paralisações. O metrô também segue com capacidade máxima nos horários de pico.
Negociações continuam
A portas fechadas, os empresários, o Sindicato dos Rodoviários e o DFTrans tentam uma solução para o problema desde terça-feira, quando os rodoviários das empresas Cootarde e Riacho Grande cruzaram os braços. Estas duas já circulam normalmente.
Ontem, ficaram reunidos desde as 9h, mas não chegaram a um acordo, já que os empresários dizem faltar dinheiro para o repasse do reajuste aos rodoviários.
Se nada for resolvido, hoje, às 17h30, haverá uma audiência de reconciliação marcada pelo TRT para tentar pôr fim à greve.
Pense nisso
A licitação de todas as linhas de ônibus era a esperança de uma nova realidade para o transporte público do DF. Mas até agora o cenário não é dos melhores: ocorreram sucessivas paralisações neste ano, a maioria por conta do reajuste salarial. Ou seja, as empresas, em parte, são novas, mas os problemas são antigos. Além disso, as companhias mal começaram a rodar e já cobram maior parcela de lucro. Por essa os passageiros não esperavam, e são eles quem estão pagando o preço.