Caroline Romeiro (*)
Raiane Oliveira de Araújo (*)
Casos de internações e mortes suspeitos registrados em São Paulo nos últimos dias chamam a atenção para um risco não tão raro quanto parece: a presença de metanol em bebidas alcoólicas adulteradas. A substância, utilizada na indústria como solvente e em combustíveis, é imprópria para consumo humano, pois, mesmo em pequenas quantidades, pode causar sequelas graves e a morte.
A prática clandestina consiste em adicionar metanol para fazer “render” a bebida, aumentando o volume, e, consequentemente, o lucro. Como o metanol tem aparência, cheiro e gosto semelhantes ao etanol (o álcool comum das bebidas), torna-se praticamente impossível ao consumidor identificar a fraude apenas pelas características sensoriais.
O grande perigo está no que ocorre após a ingestão. O fígado metaboliza o metanol e gera compostos tóxicos, como o formaldeído e o ácido fórmico, substâncias que atacam principalmente o sistema nervoso e o nervo óptico, podendo resultar em perda irreversível da visão, convulsões, coma e falência de órgãos. Para se ter uma ideia, cerca de 10 ml (menos que uma tampinha de garrafa) e doses pouco maiores podem ser fatais e já causar cegueira.
CUIDADOS – Outro desafio é que os sinais clínicos iniciais se confundem com os da embriaguez. Tontura, dor de cabeça e náusea podem mascarar o quadro, retardando a procura por atendimento. Somente horas depois surgem sintomas mais graves, como visão turva ou perda da visão, momento em que a intoxicação já evoluiu. Esse atraso contribui para a alta letalidade dos casos.
Diante desse cenário, especialistas reforçam medidas de prevenção: comprar bebidas apenas em estabelecimentos confiáveis, desconfiar de preços muito abaixo, verificar lacres e rótulos, e exigir nota fiscal. O selo de fiscalização do Ministério da Agricultura e o registro do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), quando exigido, também são indicativos de autenticidade.
ANTÍDOTOS – A intoxicação por metanol é considerada uma emergência médica. O tratamento deve ser imediato em ambiente hospitalar, podendo incluir uso de antídotos específicos (como etanol ou fomepizol), correção da acidose metabólica e diálise. Quanto mais rápido o atendimento, maiores as chances de sobrevivência sem sequelas.
Casos semelhantes já foram registrados em diversos países, como Turquia, Rússia e Laos, resultando em surtos com dezenas de mortes. No Brasil, a recorrência desse tipo de fraude mostra que não se trata de um problema isolado, mas de um risco real associado ao consumo de bebidas sem procedência.
(*) Coordenadora Técnica de Nutrição do Conselho Federal de Nutrição e docente do curso de Nutrição da Universidade Católica de Brasília (UCB)
(**) Estudante do 8º semestre de Nutrição da UCB