“O Agente Secreto”, de Kleber Mendonça Filho, foi escolhido nesta segunda-feira (15) pela Academia Brasileira de Cinema como o representante oficial do Brasil na disputa por uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Internacional em 2026.
Vencedor dos prêmios de Melhor Direção e Melhor Ator no Festival de Cannes 2025, o filme já passou por importantes vitrines como Toronto, Telluride e Brasília. Chega aos cinemas brasileiros no dia 6 de novembro tendo no elenco Wagner Moura, Maria Fernanda Cândido, Gabriel Leone, Hermila Guedes, Carlos Francisco e Alice Carvalho.
Distopia tropical entre carnavais e cicatrizes
A equipe do Brasília Capital acompanhou a cabine de lançamento do filme na sexta-feira (12). Nele, Kleber Mendonça Filho entrega um retrato profundamente político e humano do Brasil da década de 1970, um país sufocado por um violência tão escancarada (da ditadura militar) que se torna entretenimento. Pulsante em cor, ritmo e contradição, o protagonista, Marcelo, vive um pesadelo em uma cidade que vive o Carnaval.
O longa nos insere em um universo de cores saturadas, calor, fuscas, vinis, fantasias de carnaval. Um Brasil que ferve por fora, e sem que os populares percebam, apodrece por dentro. A abertura é sintomática: Recife, 1977, em um posto de gasolina onde há corpo abandonado e ignorado por todos, menos por cachorros. A Polícia aparece – como um spoiler do que veremos adiante. Revistam o carro de Marcelo, se preocupam mais com o extintor, estepe, enquanto o corpo ao lado passa despercebido. No fim, o que importa ao policial é receber dinheiro para a caixinha de Carnaval, ou mesmo um maço de cigarro. Não lhes dê o que querem e vire mais um corpo não visto. Este é o tom do filme.
O Agente Secreto, por outro lado, pode ser uma narrativa industrial, de um fugitivo, de um pai e de um filho, basta escolher. O certo é que, independentemente da perspectiva, você de alguma vai chorar. E a maior de todas as causas para este sentimento é a identificação com um Brasil real.
Em tempos de polarização, as cenas mostram um quebra-cabeça político: há assassinatos cometidos por agentes do governo, um delegado coberto de serpentina e sangue, um tubarão morto com uma perna humana na barriga, e diálogos que transitam entre o absurdo cômico e o terror cotidiano:
“O Norte é Norte. O Sul é Sul. Não devem se misturar.”
“Você discorda de mim, então é comunista.”
“Não é fácil ser chamado por outro nome.”
A brasilidade em sua essência, pelo bom e pelo mal, é marca registrada. É um retrato do que muitos acreditam ser um Brasil de 50 anos atrás, mas que tem traços que ainda nos acompanham nos dias atuais.
Para quem não viveu os anos de chumbo, o filme fala de ontem, mas sussurra sobre hoje. Racismo, xenofobia, censura, manipulação da imprensa, culto à ignorância e militarismo como fetiche. A ditadura é pano de fundo, mas o que vemos é a repetição de padrões em uma sociedade que insiste em não aprender.
A trilha sonora e os símbolos visuais reforçam esse caráter alegórico da obra, que, em resumo, é um espelho do Brasil que tentam apagar, mas que permanece mais vivo do que nunca.