Ana Luisa Araujo e Fabio Goes
A intenção do Governo do Distrito Federal de instalar uma casa de passagem para pessoas em situação de rua no centro de Taguatinga tem gerado apreensão na comunidade. O projeto, ainda em fase de análise de viabilidade, prevê o acolhimento noturno de até 200 pessoas em um imóvel privado na Quadra C10, a cerca de 50 metros do Centro de Ensino Médio Escola Industrial de Taguatinga, o CEMEIT.
Por conta da proximidade com a escola, moradores e comerciantes fazem um abaixo-assinado, com o apoio da direção do CEMEIT, para pressionar as autoridades e barrar a instalação do serviço social. Gabriel Souza, diretor da instituição de ensino, reconhece a importância da política pública voltada à população vulnerável, mas teme possíveis impactos para os estudantes.
“Infelizmente, já estamos em uma região vulnerável para nossos adolescentes e jovens. Essas pessoas [em situação de rua] precisam, de alguma forma, de assistência, mas o nosso receio é a questão da segurança e as consequências que a casa de passagem pode trazer”, declara.
Elayne Carvalho, vice-diretora do CEMEIT, vai na mesma linha. “A nossa escola é de ensino médio, e o nosso público são adolescentes. Eles estão saindo de casa, deixaram de ser crianças, e muitas vezes é onde encontram várias portas que podem se abrir. E essas portas eles querem entrar”, diz ela, que é também professora.
Vice-diretora do CEMEIT, Professora Elayne Carvalho/Foto: Antonio Sabino/BSB Capital
DROGAS — Para além dos muros da escola, a docente alerta para eventuais complicações em sala de aula. “A partir do momento em que os alunos tiverem contato na porta da escola, com certeza vai fazer com que fique mais fácil entrar com substâncias ilícitas. Fora que o aluno vai querer ficar lá fora, se espelhando em coisas que não são boas. Tudo isso impacta o ambiente interno”. E completa. “A melhor solução é não instalar esse tipo de abrigo nas proximidades de nenhuma escola”.
Entrave
A proposta do novo espaço seria liderada pelo Coletivo da Cidade, entidade que promove inclusão social e tem sede na Estrutural, com apoio das secretarias de Desenvolvimento Social e da Casa Civil. Mas enfrenta entraves legais. Uma fonte ouvida pela reportagem, que preferiu não se identificar, explica que a Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS) não permite esse tipo de equipamento público na área central de Taguatinga, classificada como “zona predominantemente comercial”.
“TERRÍVEL” — O funcionamento da casa de passagem apenas na parte da noite é vista com maus olhos pelos lojistas por conta do reflexo no movimento durante o dia. É o que aponta Maxwell Lemos, locutor da JJR Utilidades do Lar, situada ao lado do local previsto para o abrigo.
“Vai ser terrível pra gente porque vai atrair muitas pessoas perigosas. Alguns andam com faca, brigam, batem. Durante a noite a gente não abre a loja, mas de dia vai ser um movimento muito ruim aqui”, salienta.
Na avaliação de Maxwell, o albergue deveria ficar em um lugar afastado dos grandes centros urbanos. “Eu até sou a favor de uma casa de assistência social, mas aqui no centro da cidade, no meio do povo, é bem perigoso”.
Já Bruno Duarte, representante de uma escola de qualificação profissional que ocupa parte do imóvel que receberia a casa de passagem, sequer sabia do projeto. “Não foi passado nada pra gente, nem para o proprietário. Estamos aqui há oito meses, locamos o prédio e não sabíamos, de forma alguma, dessa possibilidade. Trabalhamos com a evolução profissional e pessoal de jovens, e essa mudança nos prejudicaria bastante”, acrescentando que tem contrato de locação vigente.
“Não tem como isso acontecer sem diálogo ou aviso prévio. A proposta é totalmente incompatível com o que realizamos aqui”, critica.
Na Hora
Se a casa de acolhimento divide opiniões, a implantação de uma unidade do Na Hora em Taguatinga Centro não é diferente. Enquanto empresários defendem que a repartição pública fique em um prédio atualmente ocupado pelo BRB, sob a alegação de que traria mais movimento aos negócios prejudicados pelas obras do túnel Rei Pelé, a Secretaria de Justiça e Cidadania planeja colocá-lo em funcionamento no Alameda Shopping. O martelo, contudo, ainda não foi batido oficialmente.