O Distrito Federal sofre há muitos anos e a situação se agrava a cada dia com a falta de estrutura na educação pública. A superlotação de salas de aula é um dos problemas mais sérios dessa realidade demolidora do direito constitucional de educação para todos os cidadãos e todas as cidadãs do Brasil. Dentre as regionais de ensino do DF, a de São Sebastião é uma das mais problemáticas.
A população de São Sebastião aumentou desenfreadamente, e a infraestrutura necessária para o atendimento àquelas pessoas não acompanhou o crescimento. Quem vem pagando caro por isso são as crianças em idade escolar. O desmonte vem de longa data, mas, desde o fim da pandemia, São Sebastião sofre de forma escalar (ano após ano a situação só piora) com o caos no período de matrículas na rede distrital.
A região tem 28 unidades escolares, sem contar a UISS (Unidade de Integração de São Sebastião). Nas escolas, o número de profissionais em regime de contrato temporário varia de 80% a 100% dos regentes de classe. Há escolas em que apenas o corpo gestor é de efetivos(as).
Por outro lado, sobram estudantes em São Sebastião. A lista de espera da regional de ensino é uma das maiores do DF: cerca de 200 crianças fora do sistema de matrículas. Se considerarmos a lista de espera de cada uma das 28 escolas locais, o número tende a ser bem maior – e as aulas já começaram há um mês.
Falta gestão – Como lembra a diretora do Sinpro Leilane Costa, não há mágica: se não há unidades escolares suficientes para a população em idade escolar, vai faltar espaço físico para criação de novas salas de aula.
“Falta gestão! O atual governo já fez um levantamento de quantas crianças são, qual a fase escolar em que elas estão e onde elas moram? Falta planejamento conjunto entre as secretarias de Educação, Planejamento, Saúde, Conselho Tutelar e Administração Regional. Há quatro anos assistimos esse pandemônio no período de matrículas, e o governo não soluciona o problema”, cobraa dirigente.
“A falta de planejamento de gestão sobre os aspectos previsíveis, como crescimento anual de busca por matrícula na rede pública e de aumento populacional, sobretudo nas regiões periféricas, demonstra o descaso do GDF para com a população, especialmente a mais vulnerável, que tem na escola o principal espaço de desenvolvimento e de possibilidade de superação da pobreza”, analisa a pedagoga Olga Freitas, doutora em Educação.
Os números na regional de ensino de São Sebastião são alarmantes:
– Turmas de alfabetização com 39 crianças, mais do que os 10% da estratégia de matrícula (e quase o dobro do recomendado no Plano Distrital de Ensino);
– Classes especiais de integração inversa de CEIs e Escolas Classe fechadas, e até 4 crianças dentro do Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), que necessitam de cuidados exclusivos, matriculadas em turmas regulares. A aula não rende para ninguém: nem para a professora, nem para os (as) estudantes.
– Há denúncias de gestor de escola medindo os espaços livres nas salas e informando à CRE para comprovar se cabem mais alunos ou não naquele espaço.
Falta espaço físico
“A capacidade máxima de uma sala de aula deve prever o espaço mínimo de mobilidade e circulação de 1m a 1,5m para o estudante, e de 2m a 2,5m de área de circulação livre para o(a) professor(a)”, informa Olga Freitas. Resultado: várias famílias entram com ações na Justiça para garantir vagas para os filhos. Mas simplesmente não há espaço físico disponível nas escolas da região.
“Não vou nem falar do Plano Distrital de Educação. Se considerarmos os números da Estratégia de Matrícula da Secretaria, todas as escolas de São Sebastião ultrapassaram, e muito, a tolerância de 10% a mais de alunos por sala de aula”, explica Leilane.
Soluções – Em reunião com a diretora do Sinpro Leilane Costa, a Regional de Ensino informou que há medidas sendo tomadas para buscar diminuir o caos na educação em São Sebastião. Há informações de previsão de construção de quatro unidades escolares, uma para cada fase: Creche (que será a única a atender São Sebastião e o Jardim Botânico); Escola Classe, Ensino Fundamental e Ensino Médio – em São Sebastião e no setor de Jardins Mangueiral.
Apenas uma delas, um CED, tem previsão (e não confirmação) de entrega para julho deste ano. Há também duas áreas, no Setor Residencial Oeste, que a Terracap cedeu à Secretaria de Educação para a construção de uma Escola Classe e um Centro de Ensino Infantil. Mas nada foi feito até agora.
A SEE-DF informa que não há previsão de verba na Lei Orçamentária Anual (LOA), de origem distrital. Mas os documentos do processo desmentem a Secretaria: conforme o processo 00080-00187853/2020-19, a verba para construção do CEI seria proveniente do programa Proinfância, do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), de origem federal.
Enquanto isso, a Escola Classe Morro da Cruz, que também conta com turmas de ensino infantil, está instalada num local improvisado, dividindo espaço com a CRE e o Centro Interescolar de Línguas (CIL) de São Sebastião. Essa unidade está de mudança para um imóvel alugado no bairro Morro da Cruz.
A situação física do CED Zumbi dos Palmares é mais desesperadora: a escola está provisoriamente instalada num prédio particular, onde funcionava uma faculdade particular. O prédio fica no centro da cidade, não tem estacionamento, quadra, pátio ou refeitório. Até o ano passado, as salas não tinham ar-condicionado nem janelas. Este ano receberam ar-condicionado, mas o dono do imóvel alega ter ficado um ano sem receber o pagamento do aluguel da SEE-DF.
As quatro unidades escolares em construção na região não serão suficientes para atender à demanda, como explica Leilane: “O Jardins Mangueiral é um bairro que foi planejado e construído há mais de 10 anos. Já havia, nesse planejamento, a previsão de escolas. Mas elas ainda não existem. Então, quem mora na região e está em idade escolar, é direcionado ou para São Sebastião ou para o Jardim Botânico”.
Segundo Leilane, uma vez construídas, as escolas já estarão atendendo à população local em quase 100%. “Não existe planejamento para a construção de nenhuma escola na região de São Sebastião. Aliás, não existe planejamento nenhum para a educação em São Sebastião”, preocupa-se a dirigente.
“É preciso lembrar que não apenas faltam salas na rede pública, como também as existentes estão, em boa parte, sucateadas, com estrutura imobiliária precarizada, sem a infraestrutura mínima para o alcance da qualidadeda educação prevista no PDE”, avalia Olga Freitas.
A análise da especialista é ainda mais cirúrgica: “A situação da educação no DF torna-se mais grave e gritante quando nos damos conta de que o Distrito Federal é a unidade da federação que tem o IDH mais elevado do País, e onde, contraditoriamente, também a desigualdade entre pobres e ricos é uma das mais abissais”.