Uma decisão da Arquidiocese de Anápolis, à qual é subordinada a Paróquia de Olhos d’Água, distrito de Alexânia a 90 quilômetros de Brasília, está comprometendo uma tradição histórica de 49 anos. A Feira do Troca, que acontece desde 1974 na Praça Santo Antônio, no centro da cidade, terá de se deslocar para uma rua paralela, porque o padre Cleyton Francisco Garcia decidiu construir estações da Via Sacra no espaço público em frente ao templo.
Obra feita em gramado no qual eram montados os palcos para apresentação das atrações artísticas e culturais e as barracas – Foto: BsbCapital
A Igreja alega que o terreno, onde antes existia um amplo gramado no qual eram montados os palcos para apresentação das atrações artísticas e culturais e as barracas dos participantes da Feira, pertence à Arquidiocese. E que o grande número de pessoas – o Troca atrai milhares de turistas do Distrito Federal e de várias cidades de Goiás, inclusive de Goiânia – perturba o sossego da Paróquia e contraria princípios da Igreja, porque pessoas consomem bebidas alcoólicas e ouvem música em alto volume, além de outras práticas “não cristãs”.
Praça Santo Antônio – Foto: BsbCapital
A decisão de proibir o Troca na Praça Santo Antônio foi anunciada em junho passado, no domingo seguinte ao 96º Troca, durante uma missa na Paróquia Imaculada Conceição, em Alexânia, transmitida pelo Youtube. Desde então, a comunidade de Olhos d’Água tenta uma negociação. Contatos com vereadores resultaram infrutíferos. O prefeito Alysson Silva (PP), que sempre prestou pouco apoio às iniciativas culturais da comunidade – além do Troca, a cidade passou a ter um carnaval que chama a atenção de milhares de foliões –, se mantém indiferente. Em reuniões, limita-se a procurar uma “solução paliativa”, sem se posicionar contra ou a favor da população ou da Igreja. Mas, quando a festa rola, sempre aparece para cumprimentar o público e angariar votos.
Porém, como manda a tradição de meio século, o Troca tem data para ocorrer: no primeiro fim de semana dos meses de junho e dezembro. E a Feira de número 97 está marcada para os dias 3 a 5 (sexta-feira a domingo) da próxima semana. A prefeitura apresentou a possibilidade de deslocamento para ruas paralelas, no asfalto esburacado e mal-cuidado e em ruas de terra batida, em vez do amplo gramado da Praça Santo Antônio; em frente aos portões das casas dos moradores, em vez da proximidade aos bares, restaurantes e banheiros públicos do centro.
A 97 Feira do Troca será deslocada para ruas paralelas, com asfalto esburacado e mal-cuidado e em ruas de terra batida – Foto: BsbCapitalInconformados – mas conscientes de que a situação não deve se alterar em apenas uma semana –, a comunidade agora recorre ao Estado. O caminho escolhido foi buscar socorro no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Para isto, ocorre nesta segunda-feira (20), às 16h, no Hotel Fazenda do Professor Armando, uma reunião com técnicos (agrimensor, historiadora e arquiteta) do Iphan para discutir a possibilidade de tombamento da Praça Santo Antônio e de registro da Feira do Troca como Bem Imaterial.
Artesãos, artistas e representantes de manifestações culturais do distrito de Olhos d’Água estão mobilizados. Entre eles, o Boizinho, Mamulengo, Lundu, Catira, e os blocos carnavalescos Piranhas, Santinha do Pau Oco e Pinto Caipira, e a comunidade como um todo. A expectativa de todos é de que os encaminhamentos do grupo de trabalho que se pretende montar a partir desse encontro passem a orientar o Iphan em ações futuras, incluindo a possibilidade de resgatar a Feira do Troca na Praça Santo Antônio já a partir de junho do próximo ano.
O Brasília Capital não conseguiu contatos com a Arquidiocese de Anápolis, com o padre Cleyton Garcia, nem com o prefeito Alysson Silva. O espaço está aberto às suas eventuais manifestações e/ou esclarecimentos.