O marido da auxiliar de serviços gerais Gleciane Martins, 31 anos, Luís Paulo de Oliveira, 43 anos, morreu em decorrência de problemas no fígado, dia 1º de julho, no Hospital Regional de Samambaia. Em choque, a família ganhou a solidariedade do amigo Manoel Costa, 31 anos, para as providências do funeral.
No entanto, antes mesmo de chegar ao HRS para fazer o reconhecimento do morto, Costa recebeu um telefonema da viúva avisando que o corpo havia sido levado pela Funerária Renascer. A remoção foi autorizada por Gleciane após ela ser abordada por um funcionário da empresa – o que é ilegal. Mas ela se confundiu, pois o Manoel Costa já havia contratado o serviço da Funerária Santo Antônio.
Este tipo de confusão é mais comum do que se imagina. A concorrência entre os agentes funerários é muito forte, e nem sempre ocorre dentro de padrões legais e éticos. Boa parte dos profissionais do setor – os chamados “papa-defuntos” – se aproveita do momento de fragilidade dos familiares para explorá-los, visando tão-somente o lucro.
Segundo empresários ouvidos pelo Brasília Capital, a falta de licitação para a prestação do serviço, que é regido pelo poder público, permite que as irregularidades predominem. A Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejus) afirma que não há previsão para licitação. Com isso, 66 funerárias atuam por meio de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), renovado a cada 12 meses.
Investigação
No caso do sepultamento de Luís Paulo, o amigo Manoel Costa explicou para a Funerária Renascer que o procedimento seria feito pela Funerária Santo Antônio. A família acionou a empresa contratada, que entrou em contato com a concorrente. O motorista da Renascer deixou o corpo numa clínica no Setor P Sul, em Ceilândia, onde a Santo Antônio foi buscá-lo. Ao devolver os documentos para viúva, a Renascer ainda cobrou uma “taxa de translado”.
O sofrimento dos parentes e amigos de Luís Paulo já foi experimentando por muitas outras famílias brasilienses. De maio a agosto, 23 denúncias foram protocoladas Sejus. O órgão alerta que a abordagem a familiares de falecidos é ilegal, mas muito comum. Há, inclusive, investigações no Ministério Público quanto à possível participação de funcionários de cartórios e da empresa Campo da Esperança, que administra os seis cemitérios existentes no Distrito Federal.
Serviços ilegais são vendidos na internet
No domingo (20), outra flagrante ilegalidade foi vista nas ruas de Taguatinga Norte, na CNC 4, local de concentração de empresas funerárias, devido à proximidade com os hospitais Regional de Taguatinga (HRT) e Anchieta. A céu aberto, foi feita a transferência de um cadáver no meio da rua – proibido por lei – entre uma funerária licenciada e outra não licenciada. Desta maneira, os “papa-defuntos” driblam a fiscalização para atuar sem o devido licenciamento.
A reportagem do Brasília Capital entrou em contato com a funerária Pax Jardim solicitando o orçamento de um sepultamento. Um agente, que se identificou como Lincoln, informou que o serviço básico da empresa custa R$ 1.800 – o que inclui urna com visor, ornamentação, formalização e transporte do corpo.
A partir de um anúncio no site OLX, a reportagem também procurou a Pax Brasília. O agente Jáder ofereceu o serviço básico por R$ 1.300, com urna, higienização, ornamentação e até registro de morte no cartório. No mesmo site, a funerária São Miguel Arcanjo oferecia o serviço com o slogan “No momento da dor se faz necessário pessoas capacitadas e éticas para auxiliar nos trâmites legais e nos serviços fúnebres”.