Fabricio Medeiros (*)
Todo titular de algum cargo público está sob constante julgamento dos cidadãos. No nosso regime constitucional-democrático, o direito à crítica – decorrência lógica da liberdade de expressão – é uma garantia do indivíduo, especialmente quando dirigida aos agentes responsáveis pela gestão da coisa pública.
A Constituição Federal assegura aos cidadãos o direito de se manifestarem sobre qualquer tema relacionado à condução dos negócios estatais, como também o de se engajar na discussão política da forma que quiserem e como bem entenderem, sem pedir licença ou autorização a quem quer que seja e podendo se utilizar de qualquer meio de comunicação social.
Todavia, o debate político em Estados democráticos como o nosso só se revela legítimo se realizado sob o guarda-chuva constitucional. Somente com a trena da Constituição podemos medir qual o verdadeiro limite da discussão política por ela admitido, bem como o da opinião, por mais ácida que seja, inerente àquele tipo de enfrentamento.
A Constituição de 1988 escancarou seu compromisso fundante com o pluralismo político, um dos pilares sobre o qual se assenta o Estado brasileiro, criando, com isso, um ambiente favorável para a livre e desembaraçada circulação de ideias.
Por via de consequência, assegurou aos cidadãos o direito à livre manifestação do pensamento, a fim de que pudessem exercer a santa prerrogativa de indignar-se sobre os vários temas relacionados com a coletividade, notadamente sobre os assuntos públicos.
Ao mesmo tempo, porém, e como que já antecipando o juízo de que a liberdade de expressão não seria um direito absoluto ou ilimitado – como, aliás, nenhum outro direito constitucional o é –, vedou o anonimato da crítica. E o fez a fim de possibilitar o exercício, pelo eventual ofendido, de outros direitos de berço igualmente constitucionais: o de resposta e o de obter indenização por dano material, moral ou à imagem.
De se perceber, portanto, que, se de um lado o constituinte brasileiro assegurou a ampla liberdade de expressão dos cidadãos, estabeleceu, por outro, duas condicionantes que balizam o exercício desse direito de livremente opinar: a identificação do seu responsável e a possibilidade de obtenção de resposta e de reparação por dano material, moral ou à imagem.
Tudo a sinalizar que nem toda expressão de um juízo de desaprovação é tolerada pela Constituição, pois poderá haver situações em que, a pretexto de exercer o direito de posicionar-se sobre certos assuntos, descambará o cidadão para a violação de outras garantias, incorrendo na prática de ilícitos previstos na legislação brasileira.
Aos olhos da Constituição de 88, xingamento não é crítica, assim como ameaça não é liberdade de expressão. É inconcebível que a Lei Maior, que pretendeu transformar o Estado brasileiro numa descongestionada avenida para o livre trânsito de boas ideias e numa autoestrada para a ampla circulação do julgamento cidadão minimamente qualificado, acolha a cólera corrosiva de reputações e de instituições.
(*) Especialista em Direito Constitucional e professor do IDP, do IBMEC e do UniCeub