Maria Carla (*)
O resultado da eleição de uma bancada de deputados essencialmente conservadora e a reeleição de nomes que deliberadamente votam contra os interesses da classe trabalhadora não tardou a surgir.
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), reeleito deputado, disse que irá colocar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32/2020, da reforma administrativa, de volta no debate parlamentar. A proposta é um dos principais projetos do governo Bolsonaro e tem como um dos alvos a educação pública.
A PEC viabiliza a privatização dos serviços públicos e significa que, além dos impostos que já paga, a população poderá pagar também para ter educação, saúde, segurança, previdência, assistência e vários outros direitos contidos na Constituição.
Precarização
Apresentada em 2020, a PEC 32/20 é um dos principais projetos de Bolsonaro/Paulo Guedes. Anunciada como uma forma de “modernizar o serviço público” e “desinchar o Estado”, ela gera o revés disso.
Na prática, a PEC 32 destrói princípios fundamentais do serviço público, causando precarização do trabalho e do serviço prestado à população, abertura para perseguições políticas e outras perdas irreparáveis ao povo e ao Estado Democrático de Direito.
Uma das modificações que a PEC 32 traz é no artigo 37 da Carta Magna. O artigo 37-A propõe uma “inovação” com uso dos denominados “instrumentos de cooperação”, que alteram os princípios constitucionais.
O atual artigo 37 define o que é a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios e determina que tais poderes devem obedecer aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
No texto proposto no artigo 37-A da PEC, o governo Bolsonaro cria os denominados “instrumentos de cooperação”, que afetam diretamente o magistério público.
“O governo determina que o serviço público pode ser executado por meio de instrumentos de cooperação. A exceção fica para as atividades privativas de cargos típicos de Estado. Ou seja, implanta a privatização dos serviços públicos por meio dos instrumentos de cooperação”, explica Cláudio Antunes, diretor do Sinpro-DF.
Quebra da estabilidade
Em estudo preliminar sobre o texto do artigo 37 proposto pela PEC 32/20, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) explica que “ao vincular a gestão de pessoal a premissas empresariais, e sendo o governo conservador e pautado em questões ideológicas como o atual, não resta dúvida de que os novos princípios da imparcialidade, da responsabilidade, da unidade e da coordenação servirão para pautar os processos de avaliação (podendo culminar na quebra da estabilidade do servidor) e para orientar contratações de pessoal terceirizado via Organizações Sociais (OS) e mesmo por empresas privadas”.
E esclarece que “os conceitos de inovação, boa governança e subsidiariedade darão suporte à ampla privatização pretendida pela reforma e conforme dispõe o artigo 37-A da PEC 32/20: “A União, os Estados, o DF e os municípios poderão, na forma da lei, firmar instrumentos de cooperação com órgãos e entidades, públicos e privados, para a execução de serviços públicos, inclusive com o compartilhamento de estrutura física e a utilização de recursos humanos de particulares, com ou sem contrapartida financeira”.
Trata-se de uma reforma que altera a lógica do Estado, do serviço público e dos prestadores desses serviços, com grave risco de aparelhamento estatal e de amplas benevolências econômicas a setores privados com maior afinidade com os governos de plantão.
“Os fatos são duros e indicam que a reeleição desse projeto neoliberal, neocolonial e conservador, representado pelo candidato Bolsonaro, será o fim de uma conquista histórica da humanidade e respeitada em todos os países democráticos: o Estado democrático de direito e de bem-estar social, como prevê a Constituição de 1988”, alerta Berenice Darc, diretora do Sinpro.
A diretora diz que os estudos sobre a PEC 32 mostram que, numa eventual reeleição de Bolsonaro, será muito fácil transformar os serviços públicos e gratuitos, executados hoje pelo Estado brasileiro, em serviços pagos não só por causa da PEC em si, mas porque ela estará casada com várias reformas já aprovadas e legislações extintas desde 2016. Entre elas, a aprovação da lei das terceirizações irrestritas, aprovada no governo Temer.
(*) Sinpro-DF