Um vice não decorativo
Orlando Pontes
Candidato a vice-governador do DF na chapa puro-sangue do PDT encabeçada pela senadora Leila do Vôlei, o ex-presidente da Câmara Legislativa retorna à política após receber “carta de alforria” da família para atuar na vida pública.
Sem vaidade, ele disse, em entrevista ao programa Brasília Capital Notícias – eleições 2022, parceria da TV Comunitária com o blog do Chico Sant’Anna e o Brasília Capital, que aceitou o papel de coadjuvante, mas diz que terá atuação efetiva numa eventual gestão pedetista.
O acordo foi patrocinado pelos presidentes nacional e regional do partido, Carlos Luppi e Georges Michel. Ele garante estar preparado para o novo desafio. “Governar é ir para um mar muito revoltoso. Eu não faço nenhuma questão de ser governador. Faço questão de governar”.
Tanto a direita quanto a esquerda estão muito fracionadas. Não deu para unificar a oposição contra o Ibaneis?
Estamos juntos apesar de separados. Precisamos passar por esses momentos de refinamento, para entender que a lógica do todo precisa ser muito mais importante do que as partes individuais. Cada um vai colocar seus currículos, seus projetos e as pessoas vão escolher. Se houver segundo turno, como eu acredito que haverá, os que têm propostas comuns devem se unir.
Quatro anos atrás o senhor não aceitou ser candidato a governador e agora surge como vice da senadora Leila. O que mudou nesse período para fazê-lo aceitar voltar à política?
Primeiro, mudou minha família, Eu resgatei minhas filhas e a Malunga, que é a minha fazenda e minha empresa. Hoje minhas filhas têm uma consciência política. Elas viram o pai delas lutando, trabalhando e hoje elas começaram a ver a necessidade e a importância desse trabalho. Eu fico muito feliz com isso. Eu sou um tomador de decisão, e naquele momento tudo me levava a crer que eu poderia ser eleito. Eu me preparei para governar o Distrito Federal.
Você acha que poderia ser sabotado, como foi agora com o Reguffe?
Não acredito nisso. Eu tinha sido presidente da Câmara Legislativa, levando o projeto Câmara em Movimento para todas as cidades. Foi uma experiência fantástica, porque eu ia antes com a equipe fazer oficinas com as lideranças, ouvia as pessoas. Coloquei na minha sala números com as demandas. Fazia uma articulação com o Executivo, já me preparando para efetivamente ser governador. Tive esse problema porque governar é ir para um mar muito revoltoso e cheio de tubarões. Se você não tiver um porto seguro que seja sua referência, é possível que você naufrague e não volte. Eu precisava do meu porto, que é a minha família e a fazenda Malunga, que são coisas que eu defendo efetivamente. Minha família ia se esfacelar. Eu me dediquei demais à presidência da Câmara. Ficava 24 horas dedicado a isso. E perigava eu não conseguir atravessar esse mar revoltoso, porque eu não teria esse porto seguro. Aí eu resolvi voltar para minha família. Agora eu estou vivendo a melhor fase da minha vida, com minhas filhas, com meus negócios super sustentáveis, formando gente, trabalhando para ter pessoas mais felizes dentro das nossas instituições, das nossas empresas. Será que eu tenho direito de ficar sozinho com isso? Então, a minha filha me colocou à disposição, me liberou, me deu uma carta de alforria. Ela própria começou a participar de muitas ONGs, e está envolvida com essa questão de comida.
Caso se elejam, qual será a sua participação num eventual governo de Leila Barros?
Quando fui presidente da Câmara, eu tive um vice que foi meu parceiro, o Wellington Luís. A gente compartilhou. Eu conversava com ele sobre o planejamento. O vice não era uma peça decorativa. Portanto, eu assumi com a Leila, perante o (Carlos) Lupi e o (Georges) Michel, presidentes nacional e local do PDT, um compromisso de compartilhamento. A Leila é uma mulher muito forte, uma guerreira, decidida a fazer as coisas. Eu tenho a experiência que ela precisa. Nos complementamos. Não faço nenhuma questão de ser governador, mas faço questão de governar. Porque eu sei onde estão os gargalos. A gente sabe onde estão as pessoas que entendem dos assuntos. Vamos governar com as pessoas daqui. Se a questão é mobilidade, tenho uma pessoa com especialização em mobilidade. Vamos criar o Conselho de Mobilidade do DF com uma visão humanista e mais progressista.
Até a semana passada, a garantia de um segundo turno era a candidatura do Reguffe. Com a saída dele, isto torna-se uma dúvida. Vocês não estão facilitando uma possível vitória de Ibaneis já no primeiro turno?
A gente está num momento da política que é preciso colocar a cara, apresentar propostas e ir para a rua. Hoje nós temos uma ferramenta sensacional que é a internet, que a gente consegue realmente capilarizar. Temos TVs para falar de projetos, fazer debates. Estamos vivendo uma crise política de polarização. Eu brinco que as pessoas vão visitar a Malunga e se eu levar primeiro no pé de alface dizem que sou Bolsonaro, se eu levar no pé de beterraba, é porque sou Lula. A gente precisa acabar com isso, e eu estou trabalhando nisso. Eu vou governar junto com a Leila.
No projeto do PDT, qual o destino de empresas como a Caesb, a CEB (que depois de privatizada ficou com a iluminação pública) e o Metrô?
Fazer gestão pública não importa se a empresa é pública ou privada. Importa o serviço que ela presta. Essa privatização da CEB foi um estelionato. O modelo de gestão que a gente quer fazer passa pela valorização do servidor. As pessoas vão poder crescer tecnicamente e ter o mesmo status técnico que teria um gestor. Então, começaremos a ter gestores que crescem com a devida formação.
Como reconstituir essa máquina pensante? Via concursos?
Sem dúvida. A continuidade de um governo é o gestor público, o servidor público. É ele que fica governo após governo. Não podemos ter um nível de exposição do servidor público a uma colcha de retalhos que são os governos. Sai um secretário, a influência política coloca outro que muda todo o staff, às vezes, recomeça do zero. Isto está errado.
Brasília corre o risco ambiental de falência?
Claro! A gente teve um risco, que foi a falta d’água em Brasília. Aí a gente foi captar do Lago Paranoá. Aí o governo quer lotear a Serrinha do Paranoá. Não pode. Simples assim. E colocam isso como empecilho ao desenvolvimento econômico. Não! Empecilho do desenvolvimento econômico é não ter recursos naturais, é não ter sustentabilidade. E Brasília corre um risco ambiental enorme.
O PDT não fez um acordo com outros partidos do campo progressista em função da necessidade de montar um palanque do presidenciável Ciro Gomes no DF?
Não só isso, mas sim. Porque o PDT está se renovando nesta eleição. A gente precisa fazer isso. Estou chamando de um novo PDT. Estamos fazendo formação com os candidatos, mostrando o que é ser um legislador. É um trabalho de base que precisa existir.
O PDT perdeu a identidade com a morte de Leonel Brizola, ou a Educação continua sendo a prioridade do partido?
Educação é nossa prioridade. Estamos preparando um projeto de Cieps 4.0. Precisamos formar gente. Pessoas são o tijolo fundamental das instituições. As mudanças que a política faz sem prestar atenção na gestão agridem as pessoas na perspectiva de futuro.
Na questão da mobilidade, o PDT continuaria o projeto da Interbairro e nova Saída Norte?
O sistema híbrido precisa acontecer urgentemente. Precisamos colocar trilhos nesta cidade. Precisamos dar seguimento ao metrô onde for possível. Precisamos integrar isso com o VLT.
Vai dar tempo de fazer tudo isso? – Não. Mas dá para começar. Dá para planejar no longo prazo o curto prazo da política. Quando falo de curto prazo da política estou falando de quatro anos. Porque você começa a licitar, a ter projetos, a superar as exigências ambientais.
Teríamos de volta o Expresso Pequi no corredor Brasília-Anápolis-Goiânia?
Claro! Não tem como não voltar. É fundamental a gente trazer as cadeias do agronegócio, especialmente a do algodão e a do couro. A matéria prima está aqui. São cadeias altamente empregadoras. A gente precisa ter planos de curto, médio e longo prazos. Isto não existe mais porque o soluço mandatário não permite.
O quê o PDT fez em suas gestões em outros estados que podem servir de modelo para o DF?
O PDT é um partido trabalhista. Então, temos muitos programas que foram desenvolvidos em Secretarias de Trabalho e implementados no Brasil. A gente tem um plano de desenvolvimento nacional. O PDT vocaliza, através do Ciro, a exitosa experiência da Educação no Ceará. É claro que a gente vai trazer essas experiências para cá. Por isso falei dos Cieps 4.0. Estou falando de educação em tempo integral, de melhoria da qualidade de vida dos professores e também do combate à fome.
Então estamos falando de uma escola que forneceria comida para as pessoas o ano inteiro?
Hoje não podemos ter alimentação escolar. Temos de ter alimentação do escolar o ano inteiro, inclusive nas férias. Nós fizemos alguns projetos que estão ligados à qualidade de alimentação das escolas, especialmente da alimentação escolar, onde a produção é local, com formação de nutricionistas. Uma escola que tem comida o ano inteiro para as pessoas. Nas férias, a gente vai trabalhar trazendo os pais para a escola, que vira o epicentro de mudança das comunidades. A escola é a educação, e educação é processo de mudança. Mas é preciso ter atração para essas pessoas.
Em Goiás, o governador Ronaldo Caiado tem feito uma gestão voltada à educação. E isto está garantindo a liderança dele nas pesquisas, provavelmente com vitória no primeiro turno. Pode ser um paradigma para a campanha aqui no DF?
Esta é uma bandeira do PDT. Está no nosso DNA. E no novo PDT esse é o mote de fazer. É o que nós vamos fazer em Brasília.
Algum aspecto da realidade do DF foi levado em consideração?
Eu fiz um estudo no Itapoã. Em agosto já tinha registro de evasão escolar de 60% dos alunos. E uma das principais razões era a péssima qualidade das escolas. Num raio de 100 metros de qualquer escola tem um bar. Aí o menino desce do ônibus, não vai à escola e fica no bar jogando sinuca. Então a gente tem um problema seríssimo, porque ali está o traficante que recebe esse menino, acolhe. E o estrago está feito. Aí, a gente começa a falar que precisa de mais polícia – não que a polícia não seja importante. Mas tem outra coisa a ser feita antes, porque senão a fábrica fica aberta.
Talvez o maior calo do atual governo seja a Saúde. A privatização como está acontecendo hoje permaneceria na administração do PDT?
Não! Na realidade, o Rodrigo Rollemberg tinha implementado o Instituto Hospital de Base para dar agilidade aos atendimentos. Mas, com a criação do Iges, pelo Ibaneis, isto foi ampliado sem nenhum suporte de gestão, sem profissionalismo, sem entender o que é esse modelo híbrido de saúde.
E como resolver o problema agora?
Nós vamos criar duas fundações: uma para insumo e uma para manutenção. A Secretaria de Saúde vai investir muito na promoção de saúde, nos agentes comunitários. A gente vai ter uma ajuda junto com a Universidade.
O Iges desaparece?
Não nesse primeiro momento. A gente vai ter o instituto recolhido para o Hospital de Base, do tamanho que foi gestado. Vamos conversar com todas as forças de saúde. Nós teremos as UPAs num outro modelo de gestão pública. Do jeito que está elas não amortecem absolutamente em nada. Constroem UPAs, mas não tem recursos, não tem médicos nem insumos.
Como mudar isso?
Este é um trabalho que eu gostaria muito de discutir e debater. Programa de governo é assim. Eu não vi nenhum governo fazendo isso. Desde o governo Roriz não vi nenhum que tenha feito um cronograma de prioridades. O que ocorre é pegar um programa que é mostrado para a população e que depois é deixado de lado. Nós vamos fazer diferente. São doze pontos. E esses doze pontos são exatamente o que nós vamos fazer.
Na hipótese de a eleição presidencial ir para o segundo turno sem o Ciro, o PDT do DF vai para Paris ou apoiará o Lula?
O PDT do DF tem posicionamento. Aqui em Brasília nós somos progressistas, somos humanistas. E tem um campo do qual a gente precisa estar junto.