GDF afirma que chuva em Vicente Pires foi acima da capacidade da rede de drenagem, projetada dentro de uma média pluviométrica
José Silva Jr
As chuvas que caíram em Vicente Pires no fim-de-semana passado voltaram a colocar a cidade no noticiário das calamidades públicas. Ruas alagadas; casas invadidas pela água; carros arrastados e outros submersos; asfalto novo que acabou cedendo em meio ao aguaceiro. Esse foi o rastro de destruição que se viu pelas imagens gravadas pelos próprios moradores.
Mas, desta vez, o caos tem um culpado: São Pedro. O santo controlador das chuvas teria mandado mais água do que o combinado para que a rede de drenagem de Vicente Pires pudesse suportar. Pelo menos, foi essa a resposta da Secretaria de Obras ao Brasília Capital ao ser questionada sobre qual a razão para tamanho transtorno, uma vez que o GDF anuncia que já investiu mais de R$ 300 milhões em obras na cidade.
Parece brincadeira com o imaginário popular, mas não é. De acordo com a Pasta, no domingo (13) choveu 61mm em 40 minutos naquela região e em Taguatinga. “Quantidade muito acima da média”, diz a nota da Secretaria de Obras. E completa: “Uma rede de drenagem é calculada com base em inúmeros critérios técnicos, dentre eles, a média pluviométrica anual de cada Região Administrativa. Quando chove muito acima dessa média, infelizmente, em alguns casos, a rede de drenagem acaba não suportando a demanda”.
Portanto, a culpa é de São Pedro, que mandou chuva acima dos 40mm previamente combinados. E os prejuízos ficaram para a população. Mas a Secretaria de Obras recomenda que quem se sentir prejudicado deve buscar seus direitos na Justiça. “A situação das pessoas afetadas já é um processo jurídico. Em tese, elas devem recorrer ao poder Judiciário contra o Governo do Distrito Federal pedindo reparação. Sugiro que faça contato com algum jurista para mais informações”, diz a mesma nota.
Sofrimento dentro de casa
A situação em Vicente Pires ficou caótica naquele dia. O sofrimento chegou dentro das casas invadidas pelas águas. Os moradores não tinham como dar vazão ao aguaceiro. Alguns muros foram derrubados pela força do temporal e teve gente que fez buracos nas paredes para a água escorrer.
A orientação da Secretaria de Obras para que as pessoas buscassem seus direitos na Justiça só aumentou o desespero de Degmar Machado Aguiar, 58 anos. Moradora da Rua 17, ela teve a casa invadida pelo aguaceiro, que estragou eletrodoméstico, como televisão e geladeira, e outros móveis da residência: sofá e mesa. “Tenho de procurar um lugar seguro para morar. Aqui não vai ter jeito mesmo”, lamentou.
Ibaneis monta força-tarefa
Desde o início do governo, Ibaneis Rocha (MDB) promete que resolverá o problema das inundações em Vicente Pires até o fim de sua gestão. O governador chegou a montar uma força-tarefa composta por vários órgãos do GDF, que se instalaram na cidade. Diuturnamente, se vê caminhões, tratores, pás mecânicas e homens de capacete nas ruas.
Nesses pouco mais de três anos, Ibaneis investiu R$300 milhões nas obras de asfaltamento e drenagem – os técnicos diagnosticaram que o motivo de o asfalto esfarelar durante as chuvas é a falta de escoamento pelas redes de águas pluviais.
Então, a Secretaria de Obras e o Departamento de Estradas de Rodagem (DER) construiriam 22 lagoas de contenção para captar a água da chuva e lançar no córrego Vicente Pires. Além disso, haveria o alargamento da rede de águas pluviais.
Engenharia não passou no teste
Mas a engenharia não passou no primeiro teste mais próximo da antiga realidade de Vicente Pires, quando as torrentes de água abriam crateras nas ruas. E foi pelo ralo abaixo, entupindo a encanação e transbordando para avenidas e residências, fazendo os moradores reviverem seus piores dias.
Na Rua 3, o asfalto novinho em folha, que demorou anos para ser feito, cedeu em poucas horas de chuva. O trecho de 35 metros danificado estava do mesmo jeito até quarta-feira (16/3), quando a reportagem foi ao local. Havia apenas sinalização vertical desviando o trânsito. “Isso aqui vai ficar assim até quando? Sei lá. A obra do governo nunca se sabe quando vai terminar”, desabafa Bruno Júnior, 26, morador da localidade.
Casas interditadas
Segundo a Defesa Civil, foram atingidas 17 residências. Desse total, seis tiveram consequências mais graves. Três acabaram interditadas parcialmente e outras três foram notificadas em relação a instalação do muro de divisa, que impede a entrada de água.
Março ainda não acabou. E a ameaça de novas chuvas é constante. Só resta ao morador de Vicente Pires rezar a São Pedro e pedir que o Santo não exceda o volume de 40mm, compatível com a capacidade da rede pluvial da Região Administrativa.