Anna Ribeiro (*)
Um banho de sensações. O tempo subitamente mudou. O azul deu lugar ao cinza. As árvores sofriam a ação implacável do vento. Observava atenta a movimentação dos galhos. Sucumbir ou suportar, perguntava-me a cada aceno. Quase que em sequência veio o que já era anunciado pelo vento: a chuva. Chuva forte daquelas que parecia sem fim. Chuva forte.
Lá fora, tudo incerto. Trovões, poças, folhas ao chão. Do lado de cá da janela, também chovia e muito. Chuva chove o que tem pra chover. É como uma crise de choro. A gente chora até secar a fonte. Forças da natureza: a gente chove, queima, inunda, arrebenta. Por aqui chovia.
Não sei direito o que aconteceu, mas assistir à chuva me fez entender meu momento. Chuvosa. Eu não sei você, mas eu tomei muitos banhos de chuva. Eu tinha uma sensação de realizar algo quase profano. O peso das gotas batendo no meu rosto. Eu tinha certeza que eram mensagens criptografadas do céu para mim. E de fato eram. A mensagem principal era: seja livre, viva, sinta, mas sobretudo, arrisque-se!
É o que venho fazendo desde então. Corro riscos, choro, chovo, faço frio, esquento, queimo. Ando solta, solta mesmo. Solta livre, solta sem chão. Ambígua como sempre. Não categorizo sensações, estou me atentando a apenas senti-las.
A maior parte do que sentimos é, em essência, neutro. Nós é que polarizamos as coisas. A lágrima não é. A lágrima está em algum lugar dentro da gente que a torna um transbordamento alegre ou triste. Leva muito tempo e treino para a gente aprender a ser frágil.
(*) Escritora