O presidente Jair Bolsonaro sancionou nesta quarta-feira (1º) o projeto que revoga a Lei de Segurança Nacional, criada em 1983, na ditadura militar.
Bolsonaro sancionou o texto com vetos em relação ao que foi aprovado pelo Congresso (veja detalhes no fim da reportagem).
Um dos trechos vetados pelo presidente previa punição a atos de “comunicação enganosa em massa”. As informações são do portal G1.
No texto original, esses atos foram definidos como “promover ou financiar, pessoalmente ou por interposta pessoa, mediante uso de expediente não fornecido diretamente pelo provedor de aplicação de mensagem privada, campanha ou iniciativa para disseminar fatos que sabe inverídicos, e que sejam capazes de comprometer a higidez do processo eleitoral.”
O presidente é investigado no Supremo Tribunal Federal (STF) no chamado inquérito das fake news, que apura a disseminação organizada de informações falsas, com o objetivo de desestabilizar a democracia.
Na justificativa ao veto, o presidente argumentou que o trecho contraria o interesse público por não deixar claro o que seria punido – se a conduta de quem gerou a informação ou quem a compartilhou.
O presidente questionou ainda se haveria um “tribunal da verdade” para definir o que pode ser entendido como inverídico. A justificativa conclui que o trecho vetado poderia “afastar o eleitor do debate público”.
Manifestações
Outro artigo vetado previa punição a quem impedisse “o livre e pacífico exercício de manifestação”. O argumento do presidente é que haveria dificuldade para definir antes e no momento da ação operacional “o que viria a ser manifestação pacífica”.
Militares
Bolsonaro também vetou trecho que aumentava pela metade o tempo de condenação de militares caso o crime atente contra o Estado de Direito. Previa também a perda de patente ou de graduação.
A justificativa é que isso colocaria os militares em situação mais gravosa e representaria “uma tentativa de impedir as manifestações de pensamento emanadas de grupos mais conservadores.”
Servidores públicos
Também foi vetado pelo presidente o trecho que aumento de pena em um terço caso os crimes contra o Estado Democrático de Direito que forem cometidos com violência ou grave ameaça com uso de arma de fogo ou por funcionário público – que seria punido, ainda, com a perda da função.
O governo argumentou que não é possível admitir uma pena mais grave a alguém “pela simples condição de agente público em sentido amplo”.
Bolsonaro barrou ainda o trecho que permitia que partidos políticos com representação no Congresso movessem ação sobre crimes contra as instituições democráticas no processo eleitoral, caso o Ministério Público não o faça no prazo estabelecido em lei.
O governo argumenta que esse trecho não é razoável “para o equilíbrio e a pacificação das forças políticas”.
Lei utilizada contra críticos de Bolsonaro
Nos últimos meses, a Lei de Segurança Nacional foi utilizada contra críticos de Bolsonaro. Em fevereiro, o ministro do STF Alexandre de Moraes também usou a Lei de Segurança Nacional para mandar prender o deputado Daniel Silveira (PSL-RJ). O parlamentar havia divulgado vídeo com apologia ao AI-5, instrumento de repressão mais duro da ditadura militar, e defensa do fechamento da Corte. As pautas são inconstitucionais.
Cabe ao Congresso Nacional em sessão conjunta da Câmara dos Deputados e do Senado Federal analisar, em 30 dias, os vetos do presidente da República a projetos aprovados por parlamentares. Se não for apreciado neste período, o veto passa a trancar a pauta das sessões do Congresso Nacional.
O projeto aprovado pelo Congresso Nacional inclui, no Código Penal, uma lista de “crimes contra a democracia”, por exemplo:
crimes contra as instituições democráticas;
crimes contra o funcionamento das eleições; e
crimes contra a cidadania.
Nova lei
A proposta aprovada pelos parlamentares acrescenta artigos ao Código Penal para definir crimes contra o Estado Democrático de Direito.
O texto tipifica dez novos crimes, são eles:
- Atentado à soberania: prisão de três a oito anos para o crime de negociar com governo ou grupo estrangeiro para provocar atos típicos de guerra contra o país ou invadi-lo. A pena pode ser até duplicada se, de fato, for declarada guerra. Se houver participação em operação bélica para submeter o território nacional ao domínio ou soberania de outro país, a reclusão é de quatro a 12 anos;
- Atentado à integridade nacional: prisão de dois a seis anos para quem praticar violência ou grave ameaça para desmembrar parte do território nacional para constituir país independente. O criminoso também deve responder pela pena correspondente à violência do ato;
- Espionagem: prisão de três a 12 anos para quem entregar documentos ou informações secretas, que podem colocar em perigo a democracia ou a soberania nacional, para governo ou organização criminosa estrangeiros. Quem auxiliar espião responde pela mesma pena, que pode ser aumentada se o documento for revelado com violação do dever de sigilo. Além disso, aquele que facilitar a espionagem ao, por exemplo, fornecer senhas a sistemas de informações pode responder por detenção de um a quatro anos. O texto esclarece que não é crime a entrega de documentos para expor a prática de crime ou a violação de direitos humanos;
- Abolição violenta do Estado Democrático de Direito: prisão de quatro a oito anos para quem tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais. O criminoso também deve responder pela pena correspondente à violência do ato;
- Golpe de Estado: prisão de quatro a 12 anos a quem tentar depor, por violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído. O criminoso também deve responder pela pena correspondente à violência do ato;
- Interrupção do processo eleitoral: prisão de três a seis anos e multa para quem “impedir ou perturbar eleição ou a aferição de seu resultado” por meio de violação do sistema de votação;
- Comunicação enganosa em massa: pena de um a cinco anos e multa para quem ofertar, promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por terceiros, por meio de expediente não fornecido diretamente pelo provedor do aplicativo de mensagens privadas, campanha ou iniciativa para disseminar fake news capazes de comprometer o processo eleitoral;
- Violência política: pena de três a seis anos e multa para quem restringir, impedir ou dificultar por meio de violência física, psicológica ou sexual o exercício de direitos políticos a qualquer pessoa em razão do seu sexo, raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional;
- Sabotagem: pena de dois a oito anos para quem destruir ou inutilizar meios de comunicação, estabelecimentos, instalações ou serviços destinados à defesa nacional, com o objetivo de abolir o Estado Democrático de Direito;
- Atentado a direito de manifestação: prisão de um a quatro anos para quem impedir, mediante violência ou grave ameaça, “o livre e pacífico exercício de manifestação de partidos políticos, movimentos sociais, sindicatos, órgãos de classe ou demais grupos políticos, associativos, étnicos, raciais, culturais ou religiosos”. A pena pode ser aumentada se houver lesão corporal grave (de dois a oito anos), se resultar em morte (de quatro a 12 anos).
Outros pontos
O texto aprovado por senadores e deputados estabelece ainda que as penas previstas para os crimes listados acima serão aumentadas em um terço se o delito for cometido com violência ou ameaça com emprego de arma de fogo.
Se o crime for cometido por funcionário público a pena também será aumentada em um terço e o profissional perderá o cargo. Caso um militar pratique o delito, a pena aumenta em sua metade, cumulada com a perda do posto e da patente ou da graduação.
O texto também estabelece detenção de três a seis meses, ou multa, para quem incitar publicamente a animosidade entre as Forças Armadas, ou delas contra os Poderes constitucionais, as instituições civis ou a sociedade.
A proposta deixa explícito que não será considerado crime contra o Estado Democrático de Direito:
- Apelo à manifestação crítica aos poderes constitucionais;
- Atividade jornalística;
- Reivindicação de direitos e garantias constitucionais por meio de passeatas, reuniões, greves, aglomerações ou qualquer outra forma de manifestação política com propósitos sociais.